quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Calvino e as cidades perdidas


Pensando um pouco sobre o modo de vida moderno, percebemos o quanto as pessoas tendem a sentir um vazio e um certo desconforto com o desenrolar de suas vidas.
Parece que nada nos basta e que sempre falta algo para conquistarmos.
Lembrei-me de um trecho do livro de Ítalo Calvino, que reproduzo abaixo:
AS CIDADES E AS TROCAS
Ao entrar no território que tem Eutrópia como capital, o viajante não vê uma das muitas cidades, todas do mesmo ta­manho e não dessemelhantes entre si, espalhadas por um vasto e ondulado planalto. Eutrópia não é apenas uma dessas cida­des mas todas juntas; somente uma é habitada, as outras são desertas; e isso se dá por turnos.
Explico de que maneira. No dia em que os habitantes de Eutrópia se sentem acometidos pelo tédio e ninguém mais suporta o próprio trabalho, os pa­rentes, a casa e a rua, os débitos, as pessoas que devem cum­primentar ou que os cumprimentam, nesse momento todos os cidadãos decidem deslocar-se para a cidade vizinha que está ali à espera, vazia e como se fosse nova, onde cada um esco­lherá um outro trabalho, uma outra mulher, verá outras paisa­gens ao abrir as janelas, passará as noites com outros passa­tempos amizades impropérios.
Assim as suas vidas se renovam de mudança em mudança, através de cidades que pela exposição ou pela pendência ou pelos cursos de água ou pelos ven­tos apresentam-se com alguma diferença entre si.
Uma vez que a sua sociedade é organizada sem grandes diferenças de rique­za ou de autoridade, as passagens de uma função para a outra ocorrem quase sem atritos; a variedade é assegurada pelas múl­tiplas incumbências, tantas que no espaço de uma vida rara­mente retomam para um trabalho que já lhes pertenceu.
Deste modo a cidade repete uma vida idêntica deslocan­do-se para cima e para baixo em seu tabuleiro vazio. Os habi­tantes voltam a recitar as mesmas cenas com atores diferentes, contam as mesmas anedotas com diferentes combinações de palavras; escancaram as bocas alternadamente com bocejos iguais. Única entre todas as cidades do império, Eutrópia permanece idêntica a si mesma. Mercúrio, deus dos volúveis, pa­trono da cidade, cumpriu esse ambíguo milagre.
Calvino, I. As cidades invisíveis. Companhia das Letras, 1990 [Le città invisibili, 1972]

7 comentários:

  1. Mas não conseguimos trocar de vida, portanto temos de fazer valer a vida que levamos, tentando smpre buscar a felicidade em meio ao nosso dia.

    Fique com Deus, menino Leo.
    Um abraço.

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  2. Eutrópia não é Pasárgada.

    Devemos aprender a contar nossos dias e vivê-los de modo a alcançar um coração sábio.

    Abs!

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  3. Se as pessoas em vez de simplesmente só alcançar as coisas que buscam, pensasem em viver as coisas que buscam com certeza seriam mais cheias de satisfação. Muitas vezes o que procuramos não é o que queremos e sim o que nos impoem e ai que mora o perigo, porque voce não terá essa satisfação. abraço.

    Saudações do Gremista Fanático

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  4. Linda reflexão, o melhor é sempre achar o equilíbrio na vida, encontrar felicidade nos momentos simples. Abraço

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  5. Me senti parte desse texto q tu sitou, pq vou mudar de pais final de janeiroo!
    incrivel como algumas palavras de outras pessoas sao exatamente iguais a alguns momentos da nossa vida!

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  6. Eu acho...
    Que essa vida "moderna" é uma utopia e pelo consumismo vamos nos consumindo.Tentando preencher vazios com novas metas, planos interesses e amizades como se tudo tivesse um prazo de validade,e vamos comprando a idéia de que precisamos sempre de algo, enquanto a mente continua sempre a mesma, acho que é por isso essa sensação de que nada muda.

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